sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Cotas, a verdade nunca dita


O Brasil melhorou seus índices educacionais ao longo dos últimos anos. Apesar de ainda termos uma educação precária, nossos índices já foram muito piores. De acordo com o censo realizado pelo IBGE em 2000, apenas 77% da população entre 5 e 15 anos era alfabetizada. Em 2010, ano do último censo do IBGE, a quantidade de brasileiros que frequentavam a escola na mesma faixa etária da pesquisa anterior era de 96%. Um aumento considerável.

Se formos levar em consideração apenas a população de 15 anos ou mais, a taxa de analfabetismo, segundo dados do IBGE, caiu para 7% em 2017. Número acima da meta de 6,5% estipulada para 2015, porém, mais baixo do que os 7,2% registrados em 2016.

Entretanto, segundo pesquisa realizada pela Pearson, entre os 40 países analisados, o Brasil aparece na 39ª posição no ranking de qualidade da educação. Para piorar, de acordo com dados da OCDE, o Brasil é o país que possui o menor salário mínimo para professores do ensino fundamental ao médio entre os 40 países membros da organização.

Tal cenário problemático na educação nacional obriga o governo a tomar medidas como a criação da polêmica política de cotas.

Apesar de existirem muitas opiniões, sejam elas contrárias ou favoráveis, todas são praticamente unânimes em um ponto: nenhuma sabe o real motivo da política de cotas existir. Muitas pessoas de ambas as opiniões acreditam que as cotas existem para corrigirem injustiças históricas realizadas contra determinado grupo. Outras opiniões acreditam que as cotas são uma forma de compensar o ensino básico de péssima qualidade que temos. Todos estão errados.

As cotas não existem para ajudar pessoas consideradas incapazes de entrarem em uma faculdade pública ou serem aprovadas em um concurso público. Muito pelo contrário. Achar que a política de cotas menospreza a capacidade de certas pessoas por pressupor que determinados grupos são incapazes de atingirem determinadas posições é um equívoco porque, se fosse assim, o problema já teria sido resolvido.

A política de cotas não é uma política social e tampouco uma política educacional. As pessoas pensam a política de cotas como se fossem políticas de acesso, como as modificações exigidas por lei para estabelecimentos poderem receber cadeirantes. A modificação física com a construção de uma rampa é uma política para beneficiar o indivíduo cadeirante, diferentemente da política de cotas que busca beneficiar grupos.

Portanto, a política de cotas é uma política cultural. Ela existe para acelerar um processo de acesso de determinados grupos a determinadas posições. Com a política de cotas, certos grupos podem chegar a ocupar mais rapidamente certas posições e espaços, reduzindo assim o estranhamento de ter tais pessoas realizando certos tipos de trabalho.

Tal ideia de benefício ao grupo é o que torna a política de cotas uma política cultural porque as cotas não estão beneficiando o indivíduo agraciado pela política. O benefício ao indivíduo é um subproduto. O indivíduo com o benefício das cotas faz parte de uma política cultural maior com o objetivo central de criar possibilidades de haver pessoas em posições que elas não estão e nem estariam.

À medida que mais pessoas de diferentes grupos sociais começam a ocupar postos antes reservados a apenas um segmento social, quebra-se a cultura de determinadas ocupações serem exclusivas de estratos sociais pré-estabelecidos. Portanto, o estranhamento causado ao nos depararmos com pessoas em locais que não estamos acostumados a vê-las reduz, formando um novo paradigma cultural que aquele trabalho pode ser realizado por qualquer indivíduo.

A política de cotas existe para acelerar algo que demoraria séculos para ocorrer. Caso o processo de acesso a tais posições fosse realizado pelas vias naturais de desenvolvimento educacional, haveria uma perpetuação de uma cultura equivocada de que certos trabalhos são exclusivos de determinados grupos.

Não é esperado que a política de cotas exista para sempre. Ela é uma medida paliativa que deixará de existir quando cumprir seu objetivo. O tempo que levará para que o objetivo seja cumprido dependerá apenas de nós mesmos.



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