Estamos vivendo um
período de guerra cultural no mundo e também no Brasil. Talvez, o termo “guerra
cultural” possa ser considerado impróprio por alguns porque um embate entre
culturas é algo maior onde um país tenta impor seus valores a determinadas
nações, utilizando a cultura como propaganda de um estilo de vida. Os Estados
Unidos sempre foram excelentes em tal prática de guerra fria ao utilizarem o
cinema como forma de propagação cultural. De tantos vermos nos cinemas as
crianças americanas fantasiadas e pedindo doces, começamos a ter os mesmos
hábitos no dia 31 de outubro.
O termo mais apropriado
talvez seja “batalha ideológica” por se tratar de algo menor do que uma guerra
e mais relacionado com sobreposição de pensamentos ideológicos do que
sobreposição de culturas. Entretanto, “guerra cultural” é obviamente um termo
muito mais chamativo e impactante, sendo necessário em uma sociedade que adora
o espetáculo.
Compreender que vivemos
em uma sociedade do espetáculo é importante para entender a guerra cultural. Em
uma sociedade do espetáculo, as pessoas deixam de consumir produtos ou serviços
e passam a consumir o espetáculo que tais produtos ou serviços proporcionam. Quanto
maior o espetáculo, maior a chance de consumo e, principalmente, maior o valor
transmitido. Vencer a guerra cultural passa pelo quanto de espetáculo uma
ideologia proporciona.
Outro ponto importante
da guerra cultural é a iconografia. Toda cultura possui representações visuais
de símbolos e imagens que transmitem algum significado e determinam
características da cultura adotada. A iconografia é uma das representações máximas
de uma cultura e guia o comportamento e sentimentos das pessoas abrangidas pela
cultura.
Quando a iconografia é
colocada na sociedade do espetáculo, ocorre a transmissão de tais símbolos e
entendimentos para todo o imaginário coletivo. Na guerra cultural dos Estados
Unidos, os filmes são os maiores espetáculos que pulverizam a comunicação
cultural para os outros países. Na guerra cultural brasileira, ou batalha
ideológica, as redes sociais fazem o papel dos filmes.
A grande falha da
esquerda nos últimos anos foi a falta de entendimento do novo paradigma
democrático. A democracia hoje é feita online por vídeos, fotos e mensagens.
Quem dominar a propagação de conteúdo em tais canais irá vencer a guerra
cultural.
Após as manifestações
de junho de 2013, explodiram diversos movimentos com inclinação à direita no
Brasil. Por serem pioneiros, tais movimentos dominaram a comunicação e
conseguiram propagar a iconografia desejada. Ajudados por uma onda conservadora
global, os movimentos de direita cresceram, ocuparam espaços e criaram
barreiras contra a penetração de movimentos de esquerda de grande expressão nas
redes. Com discursos bélicos, ataques pessoais e conteúdo acessível para a
classe média, os movimentos de direita compreenderam e desenvolveram o
espetáculo que a sociedade queria consumir para dominarem o imaginário popular.
Com o domínio das
mídias, foi possível desenvolver a iconografia necessária para blindar o avanço
da esquerda e propagar a mensagem da direita ao poder. Ao longo dos anos, políticas
raciais e sociais foram associadas a aspectos negativos; a pobreza foi
associada a uma questão de meritocracia e esforço pessoal; e o comunismo e o
socialismo foram ligados com a miséria e a opressão. Sem as pessoas entenderem
de fato o que cada um dos pontos anteriores significava, a guerra cultural
vencida pela direita associou tais arquétipos de modo negativo ao imaginário
popular. Portanto, quando ouvimos comunismo ou políticas de cotas, instantaneamente
pensamos em algo negativo.
Apesar dos movimentos
de esquerda também terem buscado a associação de elementos da direita com
ideações negativas, como o fascismo e o nazismo, o impacto foi muito menor.
Primeiramente, o espaço a ser utilizado já estava ocupado por integrantes da
direita com uma estrutura muito maior e com mais abrangência para uma defesa rápida
com mais espetáculo. Em segundo lugar, a iconografia utilizada pela esquerda
era incompatível com o imaginário popular já dominado e o discurso “lacrador”
já demonstrava sinais de fadiga.
Para a esquerda
equiparar forças na guerra cultural, será necessário uma reformulação do
discurso e repaginação da iconografia utilizada. O discurso lacrador e
politicamente correto perdeu força. Qualquer ícone dito de esquerda que iniciar
a fala com discurso “lacrador” será imediatamente associado a vitimização e
perderá força. A abordagem precisa ser feita de outra forma.
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