quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Quanto de espuma há no chopp Marina Silva?

Não seja enganado pela espuma em copo de chopp, pois ela pode esconder a verdade por baixo de toda a sua cremosidade. Da mesma forma, nunca acredite em vôos de galinha. Essa é a lição primordial desse artigo. Por mais exuberante, imponente e longínquo, um vôo de galinha sempre terminará com o animal esborrachado no chão e com seus expectadores bolando teorias do motivo do vôo ter sido apenas um salto um pouco mais comprido e não uma decolagem rumo à estratosfera.

O Brasil já passou por diversos "vôos de galinha" durante sua curta história. Em diversos períodos de apogeu econômico, o que os antigos acreditavam ser a grande decolagem do país rumo ao desenvolvimento e primeiro mundo, na verdade foi apenas um pico curto e pouco duradouro de avanço da economia, quase sempre sucedido por longos períodos de estagnação e depressão.

Na política, tal fenômeno não é diferente. Nas eleições de 2012, tivemos um caso típico de "vôo de galinha" na corrida rumo à prefeitura de São Paulo. O candidato do partido PRB, Celso Russomanno, liderava com tranquilidade as intenções de voto dos eleitores. Durante todo o período eleitoral, Russomanno era apontado como o franco favorito à prefeitura de São Paulo e com reais chances de eleição logo no primeiro turno. Entretanto, nos últimos dias de campanha, a força do candidato "derreteu" e acabou sendo ultrapassado por Fernando Haddad e José Serra, culminando em uma exclusão de um segundo turno que parecia certo.

A dúvida que paira no ar, por volta de trinta dias da eleição, é se o "fenômeno Russomanno" voltará a acontecer. As recentes pesquisas de intenção de voto apontam a candidata Marina Silva do PSB à frente de Aécio Neves e favorita em um possível segundo turno contra a atual presidente Dilma Rousseff.

É inegável que Marina Silva tornou-se um fenômeno eleitoral por uma série de fatores: comoção pela morte de Eduardo Campos, expectativa de mudança por parte dos eleitores, insatisfação da população com a situação atual do país, rejeição à candidata Dilma Rousseff e desconhecimento sobre o candidato Aécio Neves.

Entretanto, a atual popularidade de Marina Silva talvez tenha surgido cedo de mais, tornando-a um alvo dos três maiores partidos brasileiros: PT, PMDB e PSDB. A expectativa da cúpula de Aécio Neves é o início de ataque maciço de PT e PMDB contra a candidata Marina por conta do receio de haver um segundo turno entre a candidata do PSB e Dilma Roussef. Já pelo lado de PT e PMDB, é dado como certo o ataque da oposição à candidata Marina Silvia, pois se Aécio Neves não reagir, de acordo com as pesquisas, o segundo turno será um sonho distante aos tucanos.

Para a infelicidade de PT, PMDB e PSDB, no debate realizado pela Bandeirantes, Marina Silva mostrou uma ótima capacidade de defesa e quem a atacou, acabou saindo ferido. Entretanto, Marina possui preocupações muito maiores que os certos ataques que receberá de ambos os adversários: seu partido não a apoia com totalidade e seu palanque regional é fraco.

Após o anúncio de Marina Silva como candidata substituta de Eduardo Campos, um dos militantes mais respeitados do PSB, secretário-geral do partido e coordenador da campanha do falecido presidenciável, Carlos Siqueira, abandonou sua função de coordenador e ainda disse: "da Marina, quero distância. Ela não é do PSB". Outro membro do PSB que não demonstrou seu apoio à candidata Marina Silva foi o atual deputado federal e candidato à reeleição Romário, que não pronunciou o nome da candidata durante sua aparição no horário eleitoral.

A situação de Marina Silva piora quando analisamos seu palanque regional. Sua estrutura partidária é frágil e após a morte de Eduardo Campos, todos os apoios por ele costurados por ele foram perdidos. Por outro lado, seu principal adversário ao segundo turno, Aécio Neves, possui uma vantagem considerável no que se refere aos palanques regionais.

Na Região Sul, o candidato Aécio Neves tem forte apoio no RS com a líder das pesquisas para governador Ana Amélia, além do PR com o também líder das pesquisas Beto Richa. Já no Sudeste, o PSDB nunca foi derrotado em SP, maior colégio eleitoral do país, além de MG ser curral eleitoral de Aécio. Somente no RJ o PSDB não possui uma estrutura considerável, porém, Luiz Fernando Pezão, atual segundo colocado e crescendo, faz palanque para Aécio Neves.

Já na Região Nordeste, PE é Marina Silva pela comoção e herança de Eduardo Campos, porém, a BA, maior colégio eleitoral da região, sempre foi tradicionalmente PT e o candidato a governador Paulo Souto, cotado a assumir já no primeiro turno, faz palanque para Aécio Neves. Nas outras duas regiões, o Centro-Oeste é uma incógnita com MS e MT, porém, em 2010 MT foi PSDB. Já a Região Norte está dividida com PT liderando no AM e PSDB no PA.

Da mesma forma que no passado o crescimento econômico brasileiro era artificial, o rápido crescimento de Marina Silva não condiz com a estrutura que ela possui. Para ser um vôo de verdade e não um "vôo de galinha", é necessária uma decolagem paulatina. Quando a subida do avião é muito abrupta, sempre desconfie que algo pode estar errado


quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Você é um funcionário da Coca?


Com o advento da Revolução Industrial em 1760, a produção de produtos disparou. Para que tamanha quantidade de produtos fosse absorvida pelo mercado, era necessário que mais consumidores surgissem. Uma forma de aumentar o número de consumidores era com o aumento da população, entretanto, tal medida levaria muitos anos e a espera por tal incremento populacional era inviável. A forma encontrada de aumentar o contingente de consumo foi com a abolição da escravidão. Dessa forma, os antigos trabalhadores escravos passariam a ter remuneração e, por consequência, capital para adquirirem produtos.

A Revolução Industrial também iniciou a chamada "remuneração variável". Com ela era possível fazer o trabalhador se esforçar um pouco mais em seu trabalho em troca de um pequeno adicional pecuniário no salário, algo impossível de ser feito com o trabalho escravo. Segundo Adam Smith, o pior trabalhador assalariado era melhor que o escravo mais forte.

Passados vários anos da Revolução Industrial e do fim da escravidão, organizações e formas de trabalho tornaram-se cada vez mais complexas. As organizações perceberam que utilizar somente o labor de seus funcionários não era mais suficiente para aumentar sua competitividade no mercado. Para tanto, uma nova forma de trabalho muito mais sofisticada de trabalho foi elaborada: o trabalho involuntário.

Diferentemente do trabalho voluntário, o qual o trabalhador se voluntaria para realizar uma tarefa sem qualquer tipo de ganho pecuniário aparente, no trabalho involuntário, apesar de também não apresentar ganhos pecuniários, o "trabalhador" realiza uma atividade sem perceber que a está realizando. Ao tomar um refrigerante em público, usar uma roupa com a logomarca aparente, falar bem de algum produto para um conhecido são formas de trabalho involuntário.

Quando você pára em um restaurante depois de um dia pesado de labor para tomar uma merecida cerveja gelada, pessoas ao seu redor estão observando que você está tomando aquela marca de cerveja. Se você a está tomando, provavelmente ela tem qualidade e isso pode influenciar positivamente outros clientes do estabelecimento a consumi-la. Ao tomar uma cerveja em público, você deixa de ser um consumidor para ser um garoto propaganda.

Não é à toa o ditado sobre a "propaganda boca a boca" ser o melhor tipo de publicidade. Quando escutamos algo positivo sobre um produto de um amigo, familiar ou pessoa próxima, essa pessoa deixa de ser um cliente e passa a ser um vendedor daquele produto. Um "vendedor" com um poder de influência muito superior ao de um vendedor oficial. A grande sacada da fidelização do cliente não é simplesmente a compra constante do mesmo produto. O feito está em transformar seu cliente em um vendedor não remunerado e com forte poder de influência sobre um grupo.

O ganho das organizações com o trabalho involuntário é dobrado, pois além de darem dinheiro às empresas por meio da compra de produtos e serviços, os clientes trabalham de graça para as mesmas sem qualquer tipo de pesar ou reclamação. O trabalhador involuntário realiza o seu "trabalho" de forma feliz e na maioria dos casos ele deseja fazer isso. Você, provavelmente, conhece pessoas que gostam de estampar a marca de um produto ou falar que adquiriu esse ou aquele bem.

Antoine Lavoisier disse que "na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma". Portanto, o trabalho escravo que todos pensavam que estava morto na verdade sofreu uma transformação para um tipo muito mais sofisticado de trabalho, no qual as pessoas "trabalham" felizes, gratuitamente e sem ao menos darem conta do que realmente estão fazendo. Se Adam Smith estivesse vivo nos dias atuais, ele teria que reconstruir seu pensamento e dizer que "o melhor trabalhador assalariado é inferior ao pior trabalhador escravo".

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O que você sabe sobre a independência de Londres?


Um dos assuntos principais da geopolítica mundial do momento, pouco noticiado e praticamente despercebido pela mídia brasileira, é a tentativa da Escócia de tornar-se independente do Reino Unido. No dia 18 de setembro, escoceses irão às urnas para decidir se a nação irá ser um país independente ou não. Tal mobilização é acompanhada de perto não só pela Inglaterra, mas também pela Espanha, pois a Escócia possui relações estreitas com a Catalunha.

A independência da Escócia é vista com preocupação, pois uma separação poderá incentivar outros movimentações separatistas pela Europa. Um dos possíveis motivados é a Catalunha, por essa razão o governo espanhol mostra-se contrário a separação escocesa do Reino Unido e já deixou claro que votará contra uma possível tentativa de entrada da Escócia na União Européia.

Entretanto, a principal consequência de uma possível independência escocesa só será sentida no longo prazo. Uma ideia, que está mais para um sussurro na madruga, ainda sem forças para ser um movimento consolidado e praticamente desconhecido no Brasil, começa a emergir na capital inglesa e poderá ganhar proporções após a resolução do movimento escocês: a independência de Londres.

Não há nas ruas londrinas um movimento separatista consolidado como o escocês, o basco ou o catalão. Há apenas um "burburinho" de algumas pessoas que às vezes aparecem na mídia britânica. Porém, tais pessoas argumentam a transformação de Londres em uma Cidade-Estado como sendo mais justificável do que a própria independência escocesa.

A cidade de Londres é um ponto de atração. É existente e nítida a ocorrência de um forte êxodo intelectual de toda a Inglaterra para a capital. Além do mais, o mundo globalizado fez com que imigrantes e pessoas com elevado poder aquisitivo de outros países fossem para Londres em busca de negócios.

Os jovens londrinos estão começando a trabalhar com outras nacionalidades e terem contato com outras culturas. Tal intercâmbio cultural já começa a ser percebido, principalmente no vocabulário dos jovens residentes em Londres.

Toda essa movimentação de pessoas de outros países e contato entre culturas fizeram com que a cidade de Londres pareça mais com o resto do mundo do que a própria Inglaterra. E Londres se sente cada vez mais como uma cidade estrangeira e menos como uma cidade britânica.

Londres, diferente do passado, não é rica por ser a capital do Reino Unido. Ela é rica porque é um desejado centro global de comércio onde os ricos querem fazer negócio. Os londrinos questionam onde está a recessão que tanto aflige o resto do mundo e o resto do Reino Unido: a cidade, nos últimos anos, criou dez vezes mais empregos que qualquer outra na Inglaterra.

A política econômica adotada em Londres não tem condições de atender o resto do país. A separação seria boa tanto para a cidade como para o resto do Reino Unido, pois ambos poderiam executar seu próprios interesses econômicos. Londres precisa de taxas de juros e impostos mais altos para domar um superaquecimento da economia e para aumentas os fundos necessários para os serviços públicos.

Uma Londres independente teria um PIB semelhante a Suíça e Suécia e uma renda nacional duas vezes maior que a de Cingapura, sua maior referência de Cidade-Estado no momento.

É claro que para tudo isso ocorrer são necessários anos, talvez séculos. Os ingleses, de um modo geral, são muito apegados a sua cultura. Questionar para um britânico a utilidade da Família Real é algo semelhante a questionar a existência de Deus a um evangélico. Tornar Londres independente acarretaria em uma mudança geográfica da Família Real, do Parlamento e do Banco da Inglaterra, elementos intimamente ligados à identidade da cultura britânica.

Vale destacar, porém, que a cultura não é algo estático e está em constante construção, mesmo que a passos de tartaruga. É difícil mudar a cultura de um país, entretanto, alterar a de uma única cidade é menos complicado, ainda mais se for uma cidade tão cosmopolita como é Londres atualmente.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Por que não guardo dinheiro?


No dia 30/07, em sua coluna no jornal "A Folha de São Paulo", o economista Samy Dana afirmou que o brasileiro excede seus gastos mensais em restaurantes e bares. As razões para isso podem ser diversas: falta de tempo para o preparo do almoço e do jantar, estilo de vida e preço elevado são alguns exemplos que talvez expliquem o excesso de gastos dos brasileiros com o lazer gastronômico.

Apesar de ser um texto explicativo de como gerir parte do salário gasto com lazer, Samy deixa muito claro em uma passagem do artigo que o brasileiro não sabe como gerir suas finanças. Não existe entre os brasileiros uma cultura de realização de planejamento financeiro. Nós não sabemos a forma adequada de poupar dinheiro ou fazer uma poupança. Poupar dinheiro ou fazer poupança é deixar de gastar agora para gastar no futuro. Porém, planejamento e visão de longo prazo estão longe de serem elementos culturais do Brasil.

A cultura brasileira é muito pautada no imediatismo e curto prazo sem preocupações maiores com o futuro. Porém, isso não ocorre por desleixo, indolência ou baixo nível educacional do povo. Nós somos assim por conta de acontecimentos históricos ocorridos durante as décadas de 60, 70 e 80. As gerações mais novas, nascidas nos anos 90 em diante, não têm, em seus pais e avós, exemplos de pensamento de longo prazo, pois as gerações anteriores viveram e/ou nasceram durante um contexto histórico muito diferente da realidade atual.

Até o surgimento do chamado Plano Real em 1994, o Brasil enfrentou períodos de forte instabilidade econômica: hiperinflação, mudanças de planos econômicos, alterações de moeda vigente e overnight. Tantas turbulências econômicas não permitiam que o brasileiro pudesse armazenar seu dinheiro para consumi-lo no futuro.

Durante muito tempo, o dia do pagamento transformou-se em uma verdadeira corrida aos supermercados. Como o poder de comprar ficava menor a cada dia, era fundamental comprar todos os produtos desejados e estocá-los em casa imediatamente após o recebimento dos salários. Pois, no dia seguinte após receber o pagamento pelo labor, o salário já não era suficiente para adquirir a mesma quantidade de produtos do dia anterior.

Da mesma forma, as grandes mudanças de planos econômicos impossibilitavam as empresas a planejarem-se para um horizonte de longo prazo, pois como os horizontes econômicos mudavam com frequência, um planejamento feito hoje poderia não ser tão efetivo.

A hiperinflação e as mudanças de planos econômicos faziam com que as pessoas tivessem planejamentos curtos e uma necessidade de consumir rapidamente seus recursos financeiros para evitar desvalorização salarial.

O resultado disso é observado nos dias atuais: mesmo com estabilidade econômica e inflação controlada, as pessoas ainda consomem seus recursos financeiros como se estivessem nos anos 80. Entretanto, o cenário futuro é positivo. Mesmo que em um estágio embrionário, uma maior preocupação com as finanças futuras começa a surgir entre o povo brasileiro. Viver cada dia como se fosse o último é um conceito completamente fora de moda.