terça-feira, 30 de abril de 2019

O mundo pós-moderno


O conceito da pós-modernidade é pouco familiar para as pessoas no geral. Para entender o conceito, é necessária uma volta ao feudalismo para entender a evolução das relações entre o indivíduo e o ambiente.

Durante o feudalismo, o local de nascimento de um indivíduo determinava todo o futuro da pessoa. Se um indivíduo nascesse em uma família de servos camponeses, ele seria um servo camponês. Da mesma forma, se um indivíduo fosse filho de nobres, ele seria também um nobre. Portanto, havia uma forte relação entre indivíduo e local de nascimento, pois toda a história de vida de uma pessoa já era determinada antes mesmo dela nascer.

Quando a modernidade surge, surge também a burguesia e, apesar de haver movimentação social, o local de nascimento também era determinante para o futuro do indivíduo. Se um indivíduo nascesse em uma família de médicos, ele obrigatoriamente também iria seguir a carreira médica. Da mesma forma, religião, casamento e costumes também eram determinados pelo local de nascimento.

Com a pós-modernidade, tal relação é quebrada. O indivíduo pós-moderno tem total liberdade para escolher o seu futuro. Se antes o caminho a ser seguido já era definido antes mesmo do nascimento, na pós-modernidade, o caminho só é conhecido após o nascimento do indivíduo. Alguém que nasceu em uma família de professores poderá ser professor se assim escolher, como também poderá ser advogado. Alguém que nasceu em uma família de católicos, poderá ser católico ou não ter religião.

Portanto, as relações começam a ser fragilizadas e surge a dor da escolha. Se o indivíduo é livre para escolher, ao tomar sua decisão, ele estará negando todas as outras possibilidades. Sem a referência da conexão com o local de nascimento, surge a dúvida se a escolha feita é de fato a escolha certa. Porém, como as relações são superficiais, mesmo após a escolha ser feita, ela pode ser mudada.

A superficialidade das relações acaba caracterizando o indivíduo pós-moderno como sendo alguém do “estar” em detrimento do “ser”. A condição de “estar” caracteriza algo temporário, pois nada é definitivo e profundo, ao contrário do “ser” que é uma definição mais concreta.

De tal modo, o indivíduo pós-moderno não “é” casado com o seu cônjuge, ele “está” casado. Portanto, há a possibilidade da relação matrimonial ser desfeita. Da mesma forma, as relações laborais e qualquer outra relação.

Um exemplo da superficialidade das relações é o consumo. O consumo passa ser instantâneo e corriqueiro. Não existe mais tempo para aproveitar a compra realizada porque o produto já ficou obsoleto e precisa ser trocado.

No mundo pós-moderno, tudo fica velho e precisa ser trocado rapidamente, inclusive o trabalho.
Hoje em dia, poucos trabalhadores possuem perspectiva de fazer carreira dentro de uma única empresa, mas a empresa também não possui muito interesse em manter um trabalhador por muito tempo em suas instalações. Na verdade, quanto menos pessoas trabalhando e mais enxuta for uma organização, melhor.

Quanto mais prédio, mais máquinas e mais trabalhadores, mais conexão a organização possui com o local de sua instalação. Quanto mais conexão e profundidade, mais dificuldade existe em mudar de local caso o capital decida trocar de localização.

Fábricas com milhares de funcionários e grandes estruturas prediais como as da Ford nos anos 30 são impensáveis nos dias atuais. O capital precisa ter liberdade para percorrer fronteiras sem qualquer tipo de passaporte.

terça-feira, 23 de abril de 2019

Lula e PT trocam de posição

“Vidas Secas” é a obra-prima do alagoano Graciliano Ramos e uma das principais obras da língua portuguesa. No romance, o leitor acompanha a história de uma família de retirantes sertanejos a caminho do litoral. Durante a jornada, o autor trás uma bonita reflexão sobre a vida e como o ambiente molda o ser humano.

Fabiano, pai da família de retirantes da obra, é um ser humano “embrutecido” pela seca. Da mesma forma que o sertão nordestino, Fabiano é selvagem, bruto, seco de palavras e cultura, um ser humano animalizado pelo ambiente inóspito que habita. Para o leitor mais jovem e presente na cultura pop, o raciocínio é o mesmo apresentado por Paulie, personagem dos filmes Rocky: de tanto tempo que você fica em um lugar, você acaba sendo parte dele.

O mal de Fabiano no sertão e de Paulie no açougue onde trabalhava é o mesmo mal sofrido por Lula e pelo PT. O Partido dos Trabalhadores se envolveu tanto com a prisão do ex-presidente Lula que acabou ficando preso junto ele.

Após o término da eleição, integrantes do partido disseram que o PT iria se voltar totalmente para a campanha “Lula Livre”. Justo motivo de existência para uma estratégia eleitoral visando 2022. O PT não conseguiu forjar um herdeiro político para Lula e fortalecer a narrativa da prisão injusta do ex-presidente poderá ajudar o partido com a tarefa.

Entretanto, quanto mais para dentro da prisão em Curitiba o partido se concentra, mais envolvido pelo ambiente carcerário o PT encontra-se. Da mesma forma que Fabiano e Paulie gradativamente foram se transformando nos ambientes por eles habitados, o PT vai se transformando na própria prisão de Lula, prendendo-se a Lula e prendendo-se por Lula.

O perigo da estratégia do partido é o PT se transformar em um preso assim como Lula.

Nos primeiros 100 dias do governo Bolsonaro, o partido que elegeu a maior bancada de deputados em outubro, sendo superado pelo PSL no decorrer do ano, pouco tem feito e viu seu protagonismo ser ameaçado pelo PDT.

Se a política hoje é pautada na internet e pela internet, a única ação de grande repercussão de um parlamentar do partido foi a definição de Zeca Dirceu ao ministro Paulo Guedes, sendo chamado de “tigrão de pobre e tchutchuca de banqueiro”. Pouco para um partido que continua sendo o mais importante do país.

Com relação a Fernando Haddad, segundo colocado nas eleições de 2018, a situação é ainda pior. Depois da derrota no segundo turno, Haddad sumiu. Era esperado, pelo menos por mim, que Haddad fosse fortalecer o rótulo de herdeiro de Lula durante o ciclo eleitoral de 2022.

Fernando Haddad saiu de um candidato desconhecido, derrotado em primeiro turno na prefeitura de São Paulo por João Doria, para 45% dos votos em um segundo turno de eleição presidencial. O caminho para Haddad como líder da oposição ao governo Bolsonaro parecia claro e óbvio. Entretanto, quem tomou o caminho de Haddad foi Ciro Gomes.

Enquanto Haddad está preso na prisão de Lula e do PT, Ciro Gomes está livre percorrendo o Brasil fazendo oposição a Bolsonaro. O terceiro colocado nas eleições 2018 se transformou no principal líder da oposição momentaneamente.

A liberdade de Ciro Gomes contrasta com a prisão de Haddad que parece estar mais preso do Lula.
A liberação do STF à entrevistas com o ex-presidente deixam Lula mais livre que o próprio Haddad e do que o PT. Se Haddad e PT estão praticamente presos a Lula, o ex-presidente, por outro lado, terá a liberdade para falar o que bem quiser. É como se o PT e Lula tivessem invertido as suas posições.

Preso a Lula e a Curitiba, o PT apequena-se e vê seu espaço na oposição ser reduzido por Ciro Gomes. Pela primeira vez em décadas, o maior partido de esquerda do país está com sua hegemonia ameaçada.

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Bem vindos a Democraciro

Ciro Gomes é o político brasileiro mais importante nos primeiros 100 dias do governo Jair Bolsonaro. O pedetista assumiu para si o papel de líder da oposição, rótulo que será necessário para viabilizá-lo como o candidato mais viável da esquerda para 2022.

Entretanto, a posição de Ciro Gomes é mais importante para o Brasil do que somente para a esquerda.
O Observatório Trabalhista, uma plataforma de oposição lançada pelo PDT, é a primeira grande oposição que o Brasil possui de fato em muitos anos. A cada trimestre, o PDT e Ciro Gomes irão realizar um encontro para avaliar indicadores considerados cruciais no governo Bolsonaro. Inicialmente, estavam previstos quatro indicadores: economia, saúde, educação e ciência e tecnologia. Em um segundo momento, mais dois indicadores foram adicionados: cultura e segurança.
Além da crítica ao governo, o Observatório Trabalhista tem como proposta propor caminhos alternativos para os pontos considerados importantes. A crítica de Ciro Gomes não será apenas uma avaliação vaga ou destrutiva, ela será construtiva porque uma alternativa estará sendo proposta.

O que Ciro Gomes estará fazendo com a sua ação é uma reeducação política necessária e histórica para a democracia brasileira. Os anos de PT no poder foram anos sem uma oposição atuante, fazendo com que os brasileiros desaprendessem como e o que é fazer oposição.

Em um mundo onde a internet dominou também a política, será necessário ensinar para a população como fazer oposição nos tempos modernos.

A forma de utilizar a internet para vencer uma eleição já está testada e reutilizada. A eleição de Jair Bolsonaro em 2018 é um modelo parecido com o utilizado por Donald Trump em 2016 nos EUA. A diferença é que 2016 ficou para trás.

O exemplo mais recente do sucesso da “internet política” é o candidato à presidência da Ucrânia Volodymyr Zelenskiy. Graças a uma campanha eleitoral focada nas redes sociais que mobilizou jovens voluntários de 18 a 35 anos, Volodymyr, um comediante de 41 anos, venceu fácil o primeiro turno e é o grande favorito para o segundo turno. Uma tática semelhante da utilizada por Bolsonaro.

Se a esquerda acha que os meios tradicionais de oposição dos anos 90, quando a última oposição de fato foi feita, irão funcionar, ela está muito enganada. Como efeito de comparação, 11 jornais foram responsáveis por uma tiragem diária de pouco mais de 700 mil exemplares em 2017. Um vídeo publicado no Twitter de Jair Bolsonaro desmentindo uma suposta fake news do jornal A Folha de São Paulo tinha 282 mil visualizações em apenas 9 horas

A internet dominou a comunicação e a oposição passará por ela.

A grande questão é que quem está na internet não sabe como fazer oposição. A última geração que de fato vivenciou o modo de fazer oposição está hoje com mais de 40 anos. Falta energia e interesse para batalhar as batalhas nas redes sociais. Cabe ao jovem, o nascido ou “adotado” digital a travar a batalha, mas ele não sabe e não tem instrumentos para travá-la. Jovens de direita e de esquerda.

Por tal motivo, o papel de Ciro Gomes é crucial para a democracia brasileira. Durante pouco mais de três anos, Ciro Gomes irá educar o jovem a como fazer oposição. Tanto o jovem de esquerda como o de direita serão beneficiados porque irão aprender a se opor de maneira menos agressiva e mais inteligente.

Ciro Gomes iniciará um processo de educação política do brasileiro na era digital. Com a internet, o acesso à informação foi difundido e facilitado, mas as pessoas não sabem o que fazer com ela. Ao mesmo tempo em que a internet tem potencial de politizar um povo com mais informação, ela também poder confundi-lo com a mesma informação.

Educar politicamente um povo a como fazer oposição em uma era digital é fundamental para o futuro e qualidade da nossa democracia. Ciro Gomes está se propondo a fazer e por tal razão ele é o político mais importante da atualidade, um ponto de inflexão democrática que mudará a democracia nacional.

segunda-feira, 8 de abril de 2019

Bolsonaro não representa a direita

A aprovação de Jair Bolsonaro como presidente está em queda. Primeiramente, uma pesquisa realizada pelo IBOPE apontou queda de aprovação no governo que foi confirmada por pesquisa mais recente feita pelo Instituto Datafolha. Os números do Datafolha revelam que Bolsonaro é o presidente com a pior aprovação em primeiro mandato desde 1985. Jair Bolsonaro está com índices praticamente iguais de bom ou ótimo, regular e ruim ou péssimo.

Para um governo com dificuldades de articulação com o Legislativo, inclusive com sua base do próprio partido, a aprovação popular é essencial para mostra a deputados e senadores que o presidente possui força política. Sem o respaldo populacional, a vida presidencial sempre fica mais difícil.

O resultado do Datafolha foi suficiente para parcelas precipitadas da esquerda começaram a acreditar que o caminho para a volta em 2022 estava aberto. Uma análise equivocada desmontada pelos próprios resultados da pesquisa.

Primeiramente, é necessário levar em consideração que Bolsonaro foi avaliado pelo seu comportamento e não pelas suas ações. Com poucos meses de governo, é praticamente impossível um governante conseguir realizar feitos que impactem diretamente a vida das pessoas. Para 50% dos entrevistados, Bolsonaro trabalha pouco, é autoritário para 57% e despreparado para 44%. Características que representam a imagem do presidente e não suas ações. Entretanto, para 59% dos entrevistados, a expectativa é que Bolsonaro realize um governo ótimo ou bom.

A maioria das pessoas ainda confia em Bolsonaro, apesar de ter ocorrido uma queda no valor que era de 65%.

Portanto, o descontentamento da população não é com a direita propriamente, mas sim com a figura do presidente.

A característica de governar de Bolsonaro garante certa blindagem para a direita. O presidente governa quebrando liturgias de cargos e pessoalizando a república. No governo de Bolsonaro, as pessoas estão acima das instituições. Os ministérios passam a ser sobrenomes dos ministros que os lideram. O ministério da Economia é o ministério de Paulo Guedes e não Paulo Guedes é o ministro da Economia. A pessoalizar faz com que a pessoa seja a responsável tanto pelo fracasso quanto pelo sucesso da instituição. Se Bolsonaro falhar, a culpa é dele e não da ideologia da direita.

Ao analisar os resultados do Datafolha para os ministros, é possível ter uma idéia maior que o descontentamento é exclusivamente com Bolsonaro. Entre os ministros, Sérgio Moro é aquele que possui a maior aprovação com 59%. Valor superior ao do próprio presidente. O antigo juiz da Lava Jato goza de enorme prestígio com a população e sempre é cotado para ser candidato à presidência futuramente. Sérgio Moro chegou ao ministério com popularidade maior do que a do próprio presidente. A pesquisa do Datafolha apenas confirma o seu papel central no governo.

Outro agente importante a ser considerado na equação é João Doria, governador de São Paulo. Por enquanto, não foi realizada nenhuma pesquisa para medir a aprovação do governador. Sua aprovação será muito importante para saber como será o caminho da esquerda até 2022.

Entretanto, mesmo que João Doria e Sérgio Moro tenham suas aprovações deterioradas futuramente, é essencial que a esquerda faça seu dever de casa. A oposição ao atual governo tem ocorrido por fatores internos de desarticulação do PSL. Recentemente, o líder do governo na Câmara, o criticado Major Vitor Hugo, criticou o líder do partido, o Delegado Waldir, pela falta de empenho para a aprovação da reforma da Previdência.

Se a oposição estivesse um pouco mais articulada, é possível acreditar que a aprovação do governo Bolsonaro estaria menor.