O fim da reforma da
Previdência não foi bem aceito pelo presidente Bolsonaro. Ao longo de longos
seis meses, o Brasil assistiu com olhos atentos os capítulos que antecederam o
dia da votação em primeiro turno. Mesmo havendo um segundo turno e a passagem
pelo Senado, a sensação é que a festa já acabou.
Assim como Friends e
Game of Thrones deixaram um vazio no coração dos fãs, a reforma da Previdência
também deixou um vazio no coração presidencial que não soube e não está sabendo
lidar com o final do seu principal projeto de governo. Projeto que nem era dele
para sermos justos.
Sem a reforma da
Previdência, Bolsonaro não terá um projeto rolando que irá polarizar tão
nitidamente o país. Durante a votação, foi possível identificar os espectros
políticos das pessoas baseadas na sua posição com relação à reforma: os
contrários eram de esquerda e os favoráveis eram de direita.
O próximo projeto
econômico que promete mexer com os ânimos do país é a reforma tributária.
Entretanto, a reforma tributária dificilmente irá polarizar o país como a reforma
da Previdência. Além de ser um assunto mais técnico e complexo, a reforma
tributária não terá uma votação tão simples porque ela mexe diretamente com a
arrecadação e incentivos dos Estados. Um dos desdobramentos da reforma
tributária é o fim da Zona Franca de Manaus. Deputados amazonenses de direita e
de esquerda tendem a se unirem para preservarem o seu Estado, dificultando a
tradicional polarização. Sem a polarização, Bolsonaro perde a capacidade do
conflito com a esquerda porque as definições políticas ficam mais turvas.
Entretanto, Bolsonaro
precisa do conflito para se fortalecer politicamente. O presidente cresce no
confronto com a oposição e com a imprensa. Foi assim que ganhou notoriedade nos
últimos dez anos que frequentou os programas televisivos.
Com o confronto, o
presidente consegue ativar sua militância e mantê-la engajada. Atualmente,
Bolsonaro conta aproximadamente com 30% de aprovação segundo as últimas
pesquisas. Número que o mantém sólido ao longo do tempo e que é suficiente para
garantir uma ida ao segundo turno em 2022. Portanto, Bolsonaro governa hoje
para a manutenção do seu séquito que anseia por radicalização e belicismo
presidencial.
O problema está em
Bolsonaro ter que ativar sozinho a militância. Com o Congresso em recesso e sem
grandes discussões políticas, não existem Joices, Felicianos e Waldirs para
dividirem com Bolsonaro o fardo de criar polêmicas para fustigar a esquerda.
Para piorar, até o MBL disse que irá amenizar o tom e a ironia nas declarações.
Sozinho, o presidente
irá fazer as mesmas polêmicas da época de deputado do baixo-clero, só que ele
não é mais um deputado bufão do baixo-clero. Se na época de deputado as
declarações de Bolsonaro eram vistas com um mix de indignação, constrangimento e
perplexidade, agora são vistas com o espanto de falas nenhum pouco apropriadas
ao Alvorada.
Preso a um estilo
político, não resta a Bolsonaro outro caminho se não o das polêmicas e do
conflito. Sem eles, seus apoiadores poderão dizer que o presidente foi dominado
pelo sistema, distanciando dos planos de reeleição.
Como o apoio da direita
já foi esvaziado rapidamente, resta ao presidente cultivar a admiração daqueles
que ainda o admiram. Adotar as polêmicas como forma de engajamento político é
arriscado porque elas irão ofender outros além da esquerda como no caso da
absurda fala sobre o pai do presidente da OAB.
Para Bolsonaro mudar,
seus apoiadores precisaram mudar. Todavia, depois de tanto tempo sem alguém que
os representasse, dificilmente eles irão mudar.