quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Vamos discutir política?

A população brasileira não sabe discutir política. As discussões políticas promovidas pela população são corriqueiramente pautadas em um único tema: corrupção. A corrupção presente no país é sempre utilizada como forma de criticar o governo "A" ou o governo "B", porém, corrupção e política são assuntos diferentes mesmo estando ligados. Discutir corrupção na política é um assunto, mas discutir política pela corrupção é infantil.

De acordo com o dicionário, "corrupção" é o ato de se corromper, oferecer algo para obter uma vantagem em uma negociação onde uma pessoa é favorecida e outra é prejudicada. Tal tipo de situação acontece diariamente em nossas vidas e não nos revoltamos como quando a corrupção é com o governo. Quando compramos uma roupa, o vendedor recebe uma comissão pela venda, o valor dessa comissão já está embutido no preço que pagamos; os laboratórios de medicamentos pagam jantares para médicos e os valores desses eventos estão presentes nos preços dos remédios nas farmácias; bancos dão presentes para seus melhores clientes e é o restante da clientela que arca com tais custos. As situações descritas são apenas alguns exemplos em que nós somos prejudicados e outras pessoas favorecidas.

O que acontece na política é a mesma coisa. Ouso dizer que não exista um paralelepípedo colocado nas nossas ruas que não tenha a chamada "corrupção" embutida, ou "comissão", para usar uma expressão do mercado. Isso faz parte do jogo e está presente em âmbito mundial, federal, estadual e municipal.

Muitas pessoas dizem que o Brasil é um país corrupto, porém, corrupto com relação a quem? Comparado com China, Rússia e Índia, países com grau de desenvolvimento semelhante ao brasileiro, o Brasil é menos corrupto. Obviamente, se comparado com países mais desenvolvidos, a corrupção no Brasil será maior. Porém, não podemos nos enganar e achar que nos países mais desenvolvidos não há corrupção.

A corrupção presente nos países desenvolvidos pode ser menor, mas existe. A diferença para os países em desenvolvimento são as margens. Por conta do desenvolvimento, os países desenvolvidos já possuem margens apertadas por serem economias maduras, em contrapartida, países como Brasil, por terem espaço para crescer, possuem margens fartas mais propícias à corrupção.

Outro ponto que conta é a extensa cobertura da mídia em torno de assuntos relacionados à corrupção. Escândalos de corrupção são muito atraentes e costumam render muitas notícias, por essa razão ocupam um espaço considerável nos jornais. Os jornais precisam de assuntos para vender e quando não possuem algo novo, "espremem" uma notícia até que ela se esgote; um bom exemplo foi o carnaval. Durante os dias de folia, os telejornais, principalmente, "esqueceram" os escândalos de corrupção e se concentraram quase exclusivamente em cobrir a maior festa brasileira.

Por conta da cobertura midiática sobre o assunto atrelada ao nosso "complexo de vira-lata", nos consideramos um país muito mais corrupto do que é e imaginamos que os demais países não sejam. Tal percepção é um grande equívoco que transportamos para as nossas discussões políticas, como se discutir política fosse discutir corrupção. A corrupção está presente em todas as esferas, em todas as áreas, em todos os lugares e em todos os países. Alegar que governo "A" é melhor, ou dizer que escolheu votar em candidato "B" por conta da corrupção é imaturidade.

A corrupção está institucionalizada no ser humano, por isso, discutir política pela corrupção é semelhante a discutir o sexo dos anjos. Uma discussão política de verdade é discutir as instituições, as políticas econômicas, o relacionamento externo e as políticas públicas que cada governo estabelece para o seu povo. Contudo, infelizmente, ainda somos muito imaturos politicamente

A discussão sobre a corrupção deve pautar em como a política pode criar mecanismos institucionais para evitá-la. Porém, enquanto continuarmos discutindo a corrupção pela corrupção ou política pela corrupção, assuntos vagos e que não irão resultar em nada, debates realmente relevantes, como reforma política e política externa nacional, que poderiam gerar alguma mudança, continuam abafados. A população brasileira precisa realmente aprender a como discutir política para sermos mais politizados, e, dessa forma, gerarmos alguma mudança.



quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

A moda é me alienar?

Um fenômeno que tenho observado emergir é o estilo "fones de ouvido". Com certeza, você, leitor, já deva ter visto ou deva conhecer alguma pessoa com estilo "fones de ouvido". As pessoas adeptas ao estilo "fones de ouvido" são facilmente identificadas nas ruas, nos escritórios de trabalho, nas universidades e nos shoppings: são pessoas que sempre estão utilizando fones de ouvido.

Os fones de ouvido, nos dias de hoje, deixaram de ser um aparelho para ouvir música para virarem um acessório da roupa. Os fones não são muito diferentes dos relógios, bonés, brincos, colares e óculos escuros. Eles viraram um estilo de vida que vai muito além do objetivo inicial de ouvir música sem perturbar os vizinhos.

Quando uma roupa ou acessório é utilizado, uma mensagem é comunicada e a todo o momento estamos enviando mensagens às pessoas ao redor. Um homem que anda em um carro de luxo passa a mensagem de bem sucedido, uma mulher de batom vermelho passa a mensagem de sedução, uma roupa de marca passa a mensagem de status e assim por diante. No caso dos fones de ouvido, uma mensagem misantropa.

A comunicação visual de uma pessoa com fones de ouvido é clara e em bom som: "não se aproxime e nem tente conversar comigo". Em uma situação de um grande centro urbano com os barulhos do tráfego ou no transporte coletivo é até compreensível tal misantropia. Porém, em um ambiente coletivo de trabalho, estudos, lazer ou até mesmo familiar, onde pessoas conhecidas estão ao redor, o uso e fones de ouvido é injustificável, a não ser que a pessoa não tenha o menor interesse nas outras a seu lado, o que seria, no mínimo, desrespeitoso.

Nenhuma pessoa é obrigada a gostar ou a se relacionar com todos a sua volta. Em diversos momentos, precisamos de nossa fase de introspecção, porém, fazer disso um estilo de vida misantropo é preocupante. Nós precisamos nos relacionar com outras pessoas, é uma das necessidades básicas do ser humano, mas o uso dos fones nos impede.

Como uma pessoa pode se relacionar com as outras se a mensagem comunicada é de "não me perturbe", ou pior, "não estou interessado em você"? A pessoa "estilo fones de ouvido" está isolada em seu mundo, alheia ao restante do universo que não o seu. Uma situação extremamente arrogante, como se o restante do mundo pudesse desaparecer e nada iria mudar, porque nesse universo particular criado entre um fone de ouvido e outro, aquela pessoa é a mais importante.

O desligamento do mundo real fica explícito quando esses "seres superiores" são requisitados a voltar para a nossa realidade. A reação da pessoa é como se ela tivesse que sintonizar o cérebro para o mundo ao redor. Porém, em alguns casos, a volta ao mundo real é apenas parcial, pois muitos nem se dão ao trabalho de retirar ambos os fones do ouvido, apenas puxar para o lado é o suficiente, ou seja: um recado rápido do tipo "seja breve, não quero desperdiçar meu tempo com você".

A situação está cada vez pior com a moda da ostentação. Hoje em dia, ter e falar que tem já não basta, tudo deve ser grande, porque o importante é ser visto. Por esse motivo, os fones de ouvido estão cada vez maiores, chegando quase ao ponto de fagocitar a orelha do usuário. O tamanho do aparelho e da espuma são tão grandes que a impressão é da orelha estar vedada.

O fato curioso está no público adepto ao estilo "fones de ouvido", são pessoas jovens e de uma geração que se julga altamente conectada ao mundo. Mas com qual mundo essas pessoas estão conectadas? Com o mundo criado por elas entre seus fones ou com o mundo real? Provavelmente, elas estão conectadas com o mundo que eles acreditam ser o real.




quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Para onde vai o Euro?

Para começar o texto de hoje, serei direto: a União Europeia está nas cordas. Em uma luta de boxe, quando o lutador fica preso às cordas, sua situação não é das mais privilegiadas. Nesse tipo de cenário, atacar é praticamente impossível; a falta de espaço reduz a mobilidade e impede o recuo, tornando o lutador altamente vulnerável às investidas de seu oponente. Em uma situação como essa, o melhor a ser feito é defender e aguentar o máximo o prejuízo até o gongo soar, caso o contrário, a luta será perdida.

Infelizmente, se o lutador fica preso às cordas logo no início do assalto, o tempo até o soar do gongo é lento e interminável, um calvário angustiante que coloca a fé de qualquer pessoa à prova. No caso da União Europeia, não só a fé está à prova como também a paciência. O motivo apontado pelos europeus tem nome e localização geográfica: Grécia.

A presença da Grécia na União Europeia é um erro antigo desde a sua aceitação como membro do grupo no início dos anos 80. Para evitar um avanço político soviético pelo oeste da Europa, a União Europeia decidiu aderir os gregos como membros em uma manobra mais política do que criteriosa. A manobra europeia foi uma tentativa de contenção da União Soviética que já havia dominado todo o leste europeu e na época buscava estreitar relações com os gregos.

Como se um erro não bastasse, vinte anos depois da adesão ao grupo, no dia primeiro de janeiro de 2001, a Grécia se tornou o primeiro país, fora os fundadores, a aderir ao Euro, a moeda única da União Europeia. Mesmo com os rigorosos critérios de adesão, os gregos conseguiram adotar a moeda única do bloco, provando ser um país estável e seguro. Entretanto, a segurança durou até o primeiro sinal de instabilidade: a crise de 2008.

Com a crise de 2008, a União Europeia necessitou resgatar financeiramente seus membros mais fragilizados para que o bloco não padecesse, pois prosperidade e desenvolvimento dos membros são dois de seus ideais. Entretanto, para que o resgate fosse feito, o dinheiro utilizado teve que ser deslocado das economias mais poderosas para as mais fragilizadas. Dessa forma, o que poderia ser utilizado em prol das economias mais fortes, como a Alemanha, teve que ser utilizado por outros países.

Nessa situação, uma das nações mais afetadas foi a Alemanha, pois por ser o país economicamente e geopoliticamente mais forte do bloco, caberia a ela resgatar seus vizinhos, entre eles a Grécia. Apesar de o resgaste econômico ser praticamente uma obrigação, ele não é visto com bons olhos pela população germânica. A população alemã questiona o dinheiro proveniente de seus impostos serem emprestados aos gregos, por exemplo, ao invés de investido em seu próprio país. Na cabeça dos alemães, se os gregos não souberam se administrar, não é problema da Alemanha.

A situação da União Europeia ficou ainda mais delicada após as eleições gregas vencidas por um partido de esquerda. O novo governo grego propõe ao restante do bloco econômico um afrouxamento da anistia imposta a Grécia e recentemente desistiu de entrar com um ventilado pedido de perdão da dívida. A Alemanha, principal credor do bloco, por sua vez, já afirmou que não enviará mais dinheiro aos gregos sem o programa de anistia.

Enquanto as negociações políticas caminham, a população grega sofre com desemprego e aumento nos níveis de pobreza. A Grécia alega que a não aceitação da Alemanha dos pedidos sobre o programa de austeridade são uma afronta à democracia, pois é o desejo de sua população. Porém, a Grécia esquece que democracia é uma via de mão dupla e não pode desconsiderar o desejo da população alemã.

Para o Banco Central dos EUA, a saída da Grécia da zona do Euro é apenas uma questão de tempo. Para os alemães, a saída grega seria desastrosa e culminaria com o fim da moeda única, pois seria compreendido que países com velocidades de funcionamento tão diferentes não combinam para ter o mesmo dinheiro circulando.






quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

A Petro te frustrou?

Nos últimos meses temos acompanhado pela imensa cobertura da mídia um dos maiores escândalos de corrupção do Brasil: o caso da Petrobrás. Quase diariamente, os noticiários são tomados com notícias de novos escândalos e desvios de dinheiro que são revelados com as investigações da "Operação Lava Jato". Hoje em dia, é praticamente impossível não ligar a televisão ou visitar um site de notícias que não traga ao menos uma notícia sobre o assunto.

Mais atentos que a população em geral ao caso da Petrobrás, os acionistas da empresa acompanham e reagem de forma coletiva a cada nova notícia divulgada. Se em 2008 as ações preferenciais da Petrobrás chegaram ao valor aproximado de R$ 41,00, nos dias atuais, seu valor ronda a casa dos R$ 8,00. Tal derretimento no valor acionário, tendo como uma das causas os escândalos de corrupção, resultou em uma ação judicial de acionistas americanos à Petrobrás.

As pressões por parte dos acionistas, mídia e população foram tão grandes que resultaram na renúncia da engenheira química Graça Foster da presidência da Petrobrás. A escolha por Graça Foster ao cargo de presidente da empresa foi uma tentativa de realizar uma opção mais técnica e menos política. Entretanto, como a Petrobrás é um agente importante para controlar a inflação do país, as decisões sobre preços permaneceram a cabo de seu acionista majoritário: o governo.

Uma das últimas pressões que ganhou os noticiários recentemente foi referente à divulgação do balanço contábil da Petrobrás do terceiro trimestre do ano passado. A divulgação do balanço contábil, segundo a mídia, frustrou as expectativas e não divulgou as perdas contábeis por corrupção. A companhia deu a justificativa que não conseguiu encontrar uma metodologia para realizar o cálculo e irá se informar junto às entidades competentes em como realizá-lo.

Entretanto, do ponto de vista contábil, a queixa da mídia não possui qualquer tipo de fundamento. É válido o questionamento se o balanço é lícito por não possuir uma auditoria responsável e também é possível questionar a veracidade dos números apresentados, porém, dizer que o balanço não contém as perdas por corrupção é absurdo. Nos padrões contábeis atuais, não há campos a serem preenchidos com valores referentes à "corrupção".

Calcular contabilmente as perdas com corrupção é a mesma situação que calcular a perda com custo de oportunidade: é possível fazê-lo economicamente, porém sem qualquer valor para a contabilidade. A companhia pode, em uma nota explicativa no balanço, divulgar um valor estimado para as perdas com corrupção. Porém, os números que estamos vendo na mídia são apenas meras estimativas do real valor perdido.

Portanto, o balanço contábil da Petrobrás pode ser frustrante por vários motivos, por ter tido seu lucro reduzido, por exemplo, mas não por ausentar as perdas por corrupção. A "frustração" que a mídia está dizendo é apenas poeira levantada que encobre a verdade da população. É por conta do episódio do balanço da Petrobrás, por exemplo, que precisamos sempre estar atentos e sempre questionarmos a informação que nos chega.

Como artifício político visando à eleição presidencial de 2018, as declarações da mídia sobre a não divulgação das perdas por corrupção nos balanços contábeis da Petrobrás são válidas. Porém, não passam de falácias, pois nenhuma organização do mundo tem condições, contabilmente, de divulgar suas perdas por corrupção. Tal questionamento da mídia brasileira fica ainda mais sem cabimento se levarmos para uma escala global.

A mídia internacional não questiona as perdas contábeis por corrupção das petrolíferas russas, por exemplo. Em ranking sobre a corrupção nos países divulgado pela ONG Transparency International, a Rússia ocupa a posição número 136 dentre 175, enquanto o Brasil está na posição 69. A colocação brasileira é ainda melhor que dos outros BRICs, China e Índia, os quais não possuem suas empresas questionadas por não trazerem perdas com corrupção em seus balanços contábeis.

Criticar uma empresa por não divulgar suas perdas com corrupção em seus balanços contábeis é algo tão absurdo quanto criticar um paralítico por ele não poder andar. A diferença entre ambos está no fato que a impossibilidade do paralitico andar é evidente, enquanto a impossibilidade de uma empresa, para o grande público, apresentar contabilmente suas perdas por corrupção é mais obscura que o balanço da Petrobrás.