quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Água valendo mais que diamantes?

A crise hídrica enfrentada pelo Brasil, principalmente pela cidade de São Paulo, faz surgir uma situação interessante: água valendo mais que diamantes. O filósofo e economista Adam Smith explica o paradoxo da água, um produto essencial para a vida, valer menos que diamantes, um mero supérfluo, em razão de sua abundância. Como o atual momento da cidade paulista é de escassez, pela lei da oferta e demanda, quando um produto é rarefeito, seu preço aumenta.

Na realidade, não é o preço da água propriamente dito que irá aumentar, pois a água não tem preço. Vale salientar que a água consumida por nós não é tributada, pagamos pelo serviço de sua distribuição até nossas torneiras. Portanto, encarecendo o serviço, o custo da água fica, indiretamente, mais caro para o consumidor.

Paralelamente ao preço elevado, vemos um aumento no valor atribuído a água. Em vários anos, nunca um produto tão abundante em cenário brasileiro teve tanta importância atribuída. Com o encarecimento da distribuição, previsão de racionamento e escassez, a elite paulistana já começa a investir na construção de poços artesianos em seus próprios quintais, investimento que pode chegar a R$ 150.000,00, mais caro que vários colares de diamantes da Tiffany & Co..

A perfuração de poços artesianos, algo tão trivial em fazendas e pequenos sítios, começa a aparecer na cidade de São Paulo. Algo tão simplório como perfurar a terra até chegar ao lençol freático passa de algo comum da vida do campo para ser objeto de luxo na grande cidade. Devido à escassez de água, a elite tem a oportunidade de mostrar seu poder não mais com carros ou joias, mas sim com um posso artesiano no quintal, exibindo sua total independência da escassez da distribuição da Sabesp.

Para os que não podem perfurar seu próprio poço artesiano, o panorama só deve agravar nos próximos dias. O presidente da Sabesp, Paulo Massato Yoshimoto, afirmou que se os volumes dos reservatórios não aumentarem, a companhia adotará uma medida drástica de racionamento: dois dias com água e cinco dias sem. Um cenário alarmante e pouco higiênico se formos pensar em como utilizamos a água em nossas casas.

Nós utilizamos a água para tarefas simples e de escala primária em nossas necessidades: lavar as mãos, tomar banho, usar a descarga, lavar a louça, lavar a roupa, limpar a casa, aguar o jardim e para beber. O psicólogo americano Abraham Maslow, autor da chamada "Pirâmide das Necessidades", colocaria tais tarefas na base de sua pirâmide, local das necessidades fisiológicas e mais simples de serem satisfeitas. Entretanto, apesar de básicas, se tais necessidades não forem satisfeitas, os outros patamares mais complexos da pirâmide não poderão ser atingidos.

O mais intrigante de toda a situação é ver como a água se tornou algo tão desejado pelos paulistanos ao ponto de ser um objeto de demonstração de poder. A situação é no mínimo curiosa se formos lembrar que após as eleições presidenciais, diversos paulistanos criticaram e ofenderam de forma pesadas as pessoas nascidas na Região Nordeste do Brasil. Região Nordeste tão castigada e flagelada pelas constantes secas que assolam a região durante vários meses do ano.

Chega a ser peculiar o paulistano sofrer do mesmo mal que obrigou e ainda obriga os imigrantes da região Nordeste a migrarem até São Paulo. Não podemos chamar a situação de castigo divino, pois ela é no mínimo mais uma das enormes ironias do destino. O paulistano que tanto ofendeu o povo do nordeste terá a oportunidade de, pelo menos por um curto período de tempo, saborear o gosto amargo de uma das principais dificuldades do nordestino: a seca.

Entretanto, diferentemente do sertanejo nordestino que migra durante a estiagem, o paulistano não tem para onde ir: ele está preso em sua própria selva de pedra. A seca faz parte da cultura nordestina; o povo aprendeu a enfrentá-la ao longo dos anos e se adaptar, algo São Paulo desconhece. Resta saber se o paulistano será como a definição Euclides da Cunha sobre o sertanejo: "(...), antes de tudo, um forte.".

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