quarta-feira, 31 de julho de 2019

A ressaca previdenciária de Bolsonaro


O fim da reforma da Previdência não foi bem aceito pelo presidente Bolsonaro. Ao longo de longos seis meses, o Brasil assistiu com olhos atentos os capítulos que antecederam o dia da votação em primeiro turno. Mesmo havendo um segundo turno e a passagem pelo Senado, a sensação é que a festa já acabou.

Assim como Friends e Game of Thrones deixaram um vazio no coração dos fãs, a reforma da Previdência também deixou um vazio no coração presidencial que não soube e não está sabendo lidar com o final do seu principal projeto de governo. Projeto que nem era dele para sermos justos.

Sem a reforma da Previdência, Bolsonaro não terá um projeto rolando que irá polarizar tão nitidamente o país. Durante a votação, foi possível identificar os espectros políticos das pessoas baseadas na sua posição com relação à reforma: os contrários eram de esquerda e os favoráveis eram de direita.

O próximo projeto econômico que promete mexer com os ânimos do país é a reforma tributária. Entretanto, a reforma tributária dificilmente irá polarizar o país como a reforma da Previdência. Além de ser um assunto mais técnico e complexo, a reforma tributária não terá uma votação tão simples porque ela mexe diretamente com a arrecadação e incentivos dos Estados. Um dos desdobramentos da reforma tributária é o fim da Zona Franca de Manaus. Deputados amazonenses de direita e de esquerda tendem a se unirem para preservarem o seu Estado, dificultando a tradicional polarização. Sem a polarização, Bolsonaro perde a capacidade do conflito com a esquerda porque as definições políticas ficam mais turvas.

Entretanto, Bolsonaro precisa do conflito para se fortalecer politicamente. O presidente cresce no confronto com a oposição e com a imprensa. Foi assim que ganhou notoriedade nos últimos dez anos que frequentou os programas televisivos.

Com o confronto, o presidente consegue ativar sua militância e mantê-la engajada. Atualmente, Bolsonaro conta aproximadamente com 30% de aprovação segundo as últimas pesquisas. Número que o mantém sólido ao longo do tempo e que é suficiente para garantir uma ida ao segundo turno em 2022. Portanto, Bolsonaro governa hoje para a manutenção do seu séquito que anseia por radicalização e belicismo presidencial.

O problema está em Bolsonaro ter que ativar sozinho a militância. Com o Congresso em recesso e sem grandes discussões políticas, não existem Joices, Felicianos e Waldirs para dividirem com Bolsonaro o fardo de criar polêmicas para fustigar a esquerda. Para piorar, até o MBL disse que irá amenizar o tom e a ironia nas declarações.

Sozinho, o presidente irá fazer as mesmas polêmicas da época de deputado do baixo-clero, só que ele não é mais um deputado bufão do baixo-clero. Se na época de deputado as declarações de Bolsonaro eram vistas com um mix de indignação, constrangimento e perplexidade, agora são vistas com o espanto de falas nenhum pouco apropriadas ao Alvorada.

Preso a um estilo político, não resta a Bolsonaro outro caminho se não o das polêmicas e do conflito. Sem eles, seus apoiadores poderão dizer que o presidente foi dominado pelo sistema, distanciando dos planos de reeleição.

Como o apoio da direita já foi esvaziado rapidamente, resta ao presidente cultivar a admiração daqueles que ainda o admiram. Adotar as polêmicas como forma de engajamento político é arriscado porque elas irão ofender outros além da esquerda como no caso da absurda fala sobre o pai do presidente da OAB.

Para Bolsonaro mudar, seus apoiadores precisaram mudar. Todavia, depois de tanto tempo sem alguém que os representasse, dificilmente eles irão mudar.

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