O espírito vira-lata
possui suas origens bem antes do surgimento do próprio Brasil. Todo ser humano
possui necessidade interna de dotar um sentido para a sua vida. Porém, a
concepção de vontade própria surge apenas com a religião, pois o individualismo
é um dos produtos da tradição judaico-cristão.
Com o surgimento do judaísmo
e do cristianismo, as pessoas começam a escolher seus próprios caminhos, é o
chamado livre arbítrio. Apesar de haver um código de regras claro a ser seguido,
seguir ou não as regras era uma escolha pessoal e o descumprimento ocasionava
em punições para além da vida, diferentemente do que ocorria antes do judaísmo onde
a quebra das regras era punida com castigos.
Tal liberdade de
escolha de caminhos faz surgir a moralidade. Posteriormente, tal conceito é a
aprimorado com são Paulo e o rompimento da divisão dos eleitos e não eleitos
onde todos são iguais. Por fim, Santo Agostinho surge com a concepção que o
espírito é a ligação direta com Deus e a recompensa do além. Portanto, o
espírito seria o “bem”. Ao controlar o espírito, o indivíduo teria o controle
sobre as perigosas paixões corporais onde é necessário o domínio dos impulsos
naturais para a salvação.
Tal noção de Santo
Agostinho passa a vigorar de modo invisível dentro do contexto moral coletivo.
Se todos nós nascemos dentro de um contexto moral, tal contexto é o que vai
definir os sentimentos morais do indivíduo. Portanto, no passado, havia uma
concepção moral de que a salvação se encontrava no além-mundo e era necessário o
controle dos impulsos corporais para atingi-la. Surge assim, uma hierarquia
moral do cristianismo onde o corpo era considerado o banal e o espírito a
dignidade e o caminho para Deus.
Com o advento da
Reforma Protestante, ocorre um enorme impacto cultural no mundo. Inclusive nos
países católicos. O protestantismo surge reforçando as características da
disciplina e do autocontrole, influenciando as organizações que acabam
influenciando a nossa vida consequentemente.
O grande impacto da
Reforma Protestante está no trabalho. Se antes o trabalho era visto como algo
desrespeitoso, agora ele é sagrado e fonte de toda a honra de Deus na terra,
passando assim a ser um modo de auto-estima, respeito e reconhecimento social.
Nada é mais democrático o tal mensagem porque todos trabalham e qualquer forma
de trabalho é digna desde que sejam bem feito.
Um dos primeiros a
compreender tal influência protestante no mundo é Max Weber que entende muito
bem como o protestantismo iria “morrer” para dar lugar a uma sociedade
disciplinar do capitalismo. As idéias protestantes rompem o limite religioso e
viram práticas seculares sociais e institucionais.
De tal forma, está
feito o cenário para a criação da hierarquia dos países onde a moralidade é
somada à economia. Com a hierarquia dos países, as nações protestantes são
superiores e mais honestas enquanto as católicas são inferiores e desonestas.
Paralelamente a isso, a
família também passa a ser importante como elemento de êxito na vida das
pessoas porque significaria um autocontrole do impulso sexual. Se o ato sexual
é uma necessidade interna e corporal, ela é vista como fraqueza.
Por fim, surge o
espírito de vira-lata tão conhecido no Brasil. O fato de sermos ibéricos e
católicos nos torna inferiores. Somos um povo animalizado e corrupto, dominados
pela emoção e tal incapacidade de controlar os nossos desejos corporais denotam
fraqueza e inferioridade perante nossos irmãos do norte.
Na nossa visão, o
americano é mais disciplinado e mais trabalhador. Mesmo não havendo
comprovações científicas, adotamos tal mito. Se os americanos e europeus
conseguem ser mais disciplinados é porque conseguem controlar os banais desejos
corporais. Se o controle do desejo é a glória, portanto, nada mais justo do que
nossas riquezas estarem com os mais dignos que nós.
Estamos inseridos em um
contexto cultural que nos oprime e legitima a nossa dominação. Se você se
perguntar por que nos sentimos mais inferiores, espero que agora você possa
saber e posso combater tal cultura.
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