quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Quanto vale sua autonomia?

Uma das coisas que mais admiro em Deus é a não concessão de tudo o que pedimos. Todos os dias agradeço a Ele o fato de Deus ser deus e não o Gênio do filme Aladdin. Se Deus fosse o Gênio, ele teria me concedido todas as minhas vontades e desejos, independente de quais elas fossem ou do momento que eu pedisse. A princípio isso seria maravilhoso, pois eu teria uma necessidade solucionada instantaneamente, porém a dúvida que existe é se eu realmente queria ter a necessidade realizada ou se o que realmente me agradava era apenas a ideia. Vou explicar:

Quando eu tinha 12 anos, o que eu mais queria na vida era um casal de calopsitas. Quando eu ganhei, percebi que treiná-las não seria tarefa fácil. Levei diversas bicadas e no final, acabei por desistir do adestramento por falta de paciência. Além de ter duas calopsitas que não sabiam nenhum truque especial, além de imitarem meu assovio, tive que por muitos anos limpar gaiolas e comprar comida, atividades que eu considerava abusivamente chatas e entediantes. No fim das contas, percebi que realmente me agradava a ideia de ter o casal de calopsitas, mas não as calopsitas em si.

O que ocorre conosco é que não sabemos realmente o que queremos. Muitas vezes desejamos algo porque achamos ser válido e que nos trará algum proveito, porém, no futuro esse desejo acaba se transformando em algo oneroso e terrivelmente indesejável.

Nas organizações tal fenômeno também ocorre. Funcionários bradam e lutam por mais autonomia, por mais empowerment para usar a palavra empresarial, pois acham que isso aumentará sua participação na organização, que os tornarão mais valorizados e, principalmente, mais motivados. Até tal ponto, a história não tem problemas. E não teria nenhum se os funcionários realmente soubessem o que é o tão desejado empowerment.

Empowerment nada mais é do que autonomia. Autonomia significa filosoficamente a liberdade de um indivíduo de gerir sua vida, ou seja, ter independência para tomar suas próprias decisões. Entretanto, independência e responsabilidade caminham juntas e é impossível desvincular uma da outra. Ou seja, ao ter mais empowerment o funcionário invariavelmente adquire mais responsabilidades. Mais responsabilidades significam mais trabalho, mais trabalho significa mais cobrança e mais cobrança não significa necessariamente mais salário.

As organizações buscam constantemente formas de fazer o funcionário trabalhar mais sem ter de despender uma remuneração extra por esse labor. O empowerment nada mais é do que uma ferramenta para aumentar o trabalho do funcionário sem remunerá-lo por isso. O conceito do empowerment pauta-se na teoria de divisão do trabalho, não como fragmentação do trabalho em partes menores, mas pelo conceito exposto aqui no blog anteriormente. Com tal ferramenta, gerentes começaram a dividir suas responsabilidade e certas atribuições com seus subordinados, e com essa divisão, conseguiram também dividir a culpa por possíveis fracassos.

É uma forma de mais valia, como diria Karl Marx, muito mais refinada e sofisticada, beirando a crueldade, porque na verdade, com o empowerment, os funcionários estão trabalhando mais, sem serem remunerados por isso e não sabem dessa condição, muito pelo contrário, estão felizes e desejam cada vez mais autonomia. Ansiando por isso como um viciando desejando mais crack.

Esse é o preço da sua autonomia? Mais trabalho, mais responsabilidade e mais cobrança pela mesma quantidade de salário? É essa a condição que você tanto deseja? Por isso, novamente agradeço a Deus por ser deus e não o Gênio, pois ele é sábio e nós ignorantes. Ignorantes por não sabermos o que realmente queremos. Se todas nossas vontades fossem realizadas, maiores seriam as vontades para serem desfeitas.


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